O bicho-da-seda é a larva de uma mariposa. Quando nasce mede cerca de 2,5 mm de comprimento. Durante 42 dias alimenta-se sem parar, de folhas de amoreira e sofre quatro metamorfoses.
Quando atinge o tamanho de 5cm, começa então a tecer um casulo branco e brilhante, composto por um único fio. Com um movimento geométrico infinito, em torno de seu próprio corpo, após três dias de trabalho, estará envolta em um casulo confeccionado por um fio de aproximadamente 1200 metros. Se for deixada em paz... Em 12 dias se transformará numa borboleta.
Com esses fios, há quase três décadas, ando tecendo a minha história. Por um desejo simples, desprovido de maiores intenções, eis aqui um espaço onde me proponho a compartilhar minha trajetória e falar livremente sobre todo tipo de arte, incluindo a arte de viver.
Bem-vindos ao meu mundo, onde nem tudo é sempre colorido, transparente, leve, mas que guarda em si, todas essas possibilidades...

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

O detalhe que fez toda a diferença...

Em 1993 desembarquei em Paris com um francês preso na garganta, um queixo tremendo de frio, um coração cheio de esperança e meu trabalho debaixo do braço.
No aeroporto dois amigos me aguardavam. Um francês que morou muitos anos no Brasil e um brasileiro que já morava na França há outros tantos e essa era toda a referência de aconchego que sentia, diante do desconforto do desconhecido. Mas isso não durou muito... Passamos aquela tarde passeando num Honda vermelho, fazendo um tour por toda a cidade. Ao anoitecer assisti o espetáculo que é estar na Champs Elysées no momento em que as luzes se acendem (!!!) No dia seguinte me ensinaram comprar bilhetes no metrô, me deram um guia e uma bússola, uma lista de endereços interessantes e a chave da casa. Um partiu para Tokio, outro par Banckok e eu passei dois dias dentro de casa tentando assistir televisão, comendo baguet com queijo roquefort que eram as únicas coisas que eu sabia comprar com segurança. Na rua, 8 graus a baixo de zero. Uma vontade irresistível de ficar dentro de casa esperando o verão e meus amigos voltarem. O único lugar que eu sabia ir sem dificuldades era ao aeroporto... Mas, não sei como... eu afinal estava em Paris e tinha que ir a luta. Comecei por realizar o grande sonho que era conhecer a boutique H Dupont, loja da fábrica da melhor tinta pra seda do mundo! Paguei um mico legal, minha emoção ao entrar naquela loja, escorria por debaixo dos óculos escuros. Estava diante de tantas coisas imprescindíveis para minha felicidade. Materias que eu só conhecia pelas revistas, instrumentos perfeitos e tão superiores aos que eu inventava para conseguir os mesmos resultados mas meus francos... tão parcos. Mesmo assim, pedia para ver tudo apesar da ma vontade tipicamente francesa de atender.
Por uma dessas coincidências que de coincidência nada tem, estava também visitando a loja uma Angolana/Francesa que falava um pouco de português (Deus é bom!) e apaixonada também pela pintura em seda. Começamos a trocar nossas experiências, ela tinha alguns trabalhos que me mostrou e eu tinha esse, da foto aí em cima, que na verdade é apenas um recorte de uma cena bem mais ampla. Ela ficou muito impressionada por um detalhe, um filete preto que contorna as figuras e que era impossível de se obter na seda, por uma questão técnica que não vem ao caso explicar aqui. Ela pediu para mostrar ao gerente antipático o meu trabalho. Ficaram ali dissecando a minha pintura por uns 15 minutos sem eu entender direito o que estavam falando. Depois disso recebi o primeiro sorriso francês da minha vida e um pedido para encaminhar o trabalho para a apreciação do dono da fabrica. Insegura... consenti.
Voltei lá dois dias depois, ansiosa para resgatar meu "paninho". Ah! convoquei a amiga angolana para ir comigo, claro! para encurtar esta historia, que isso não pretende ser uma biografia, encontrei o tal gerente muito mais simpático que me entregou uma carta do Monsieur Yard, o diretor da fabrica, me convidando para conhecer a industria em Saint Nazaire, (uma região linda por sinal) onde recebi por 15 dias todo o apoio técnico que precisava para poder trabalhar com a nova tinta e todos os materiais que meu dinheiro não podia comprar, tudo isso em troca de ensinar a fazer aquele filetinho.
No ano seguinte patrocinaram uma exposição em Paris, na artès galerie onde acabei levando o prêmio de melhor trabalho e nos anos seguintes, mesmo estando de volta ao Brasil, muitas vezes me apoiaram.
Mas o mais interessante dessa história na minha opinião, tem um fundo filosófico. O descaminho. Que quando sabemos trilhar, pode nos levar a "encontrar lugares surpreendentes". Essa técnica que me rendeu todas essas oportunidades, na verdade nasceu também de um erro. Quando morava em Lisboa, me sustentava com a produção e venda de lenços e gravatas para alguns políticos mais arrojados. Uma coleção inteira se perdeu naquele bendito processo de fixação que já contei no post do peixinho. A técnica do filete nasceu da necessidade e da intenção apenas de salvar aquelas gravatas e acabou por enriquecer e modificar todo o resultado. Não perdi nenhuma, além disso aumentei o preço e ninguém reclamou.
Et vive la différence!

Um comentário:

Valéria Martins disse...

Oi, Ita! Entrei no seu blog através do da Monica Loureiro, Cartas de Família, acho. Também sou filha única e me emocionei com o seu relato sobre a irmã de criação que lhe deu dois sobrinhos. Eu nunca ganhei irmã de criação, mas tenho dois sobrinhos (filhos do meu irmão do primeiro casamento do meu pai) que têm quase a minha idade. Um já me deu dois sobrinhos-netos (hehehe, tenho 42 e já sou tia-avó) e a outra está grávida da minha sobrinha-neta. Legal, né?
Estive aí faz um mês, na FLIP, pois trabalho em uma editora, a Record.
E também viajei sozinha este ano para o exterior - pela primeira vez sozinha no exterior - e foi uma experiência difícil, mas muito enriquecedora. Os relatos estão lá no meu blog, em fevereiro ou março. Ano que vem vou aos EUA e Tailândia (se nada acontecer até lá, sozinha novamente).
Beijos